Acordo entre Fiocruz e multinacional GSK define ainda uma ação inédita em pesquisa e desenvolvimento de vacinas contra dengue, febre amarela inativada e malária vivax
O Ministério da Saúde dá mais um passo para reduzir a dependência tecnológica no setor e impulsionar a indústria farmacêutica nacional. Nesta segunda-feira, 17 de agosto, firmou acordo de transferência de tecnologia com a empresa inglesa GlaxoSmithKline (GSK) para a produção da vacina pneumocócica conjugada, que protege contra a pneumonia e meningite por pneumococo. O imunizante será fabricado no Laboratório Biomanguinhos da Fundação Oswaldo Cruz (FioCruz – Rio) a partir do próximo ano. Ele protege contra meningite bacteriana, pneumonia e otite média aguda e entrará no Programa Nacional de Imunizações já em 2010.
“Com essa incorporação, o PNI, que é um programa de largo reconhecimento mundial, avança, se consolida e qualifica cada vez mais. Hoje, essa vacina está acessível apenas a quem pode pagar cerca de R$ 500 no mercado privado, para proteger cada criança. A partir do próximo ano, estará disponível gratuitamente no SUS”, disse o ministro da Saúde, José Gomes Temporão, durante a solenidade de assinatura do acordo.
Estima-se que a incorporação da vacina pneumocócica conjugada no SUS contribuirá para evitar a morte de 10 mil crianças por ano. A imunização se configura, assim, como mais um instrumento para que o Brasil acelere a redução da mortalidade em crianças com menos de cinco anos e cumpra antecipadamente uma das metas dos Objetivos do Milênio, estabelecidos pela Organização Mundial da Saúde.
A Fiocruz entregará a cada ano 13,1 milhões de doses da vacina, quantidade suficiente para imunizar os 3,2 milhões de bebês que nascem a cada ano.
DESENVOLVIMENTO DE NOVAS VACINAS - Além da incorporação da nova vacina ao PNI e da transferência gradual de tecnologia para produção no Brasil, o acordo firmado entre a Fiocruz e a GSK define ainda uma parceria para a instalação, na Fiocruz, de plataformas para pesquisa e desenvolvimento de vacinas contra dengue, a febre amarela inativada e a malária vivax. “Isso é absolutamente inovador, pela primeira vez uma instituição como a Fiocruz e um laboratório privado multinacional vão trabalhar juntos em fases pré-clinicas para o desenvolvimento de vacinas relacionadas a doenças do interesse do Brasil e que são importantes do ponto de vista de morbidade e de mortalidade no país”, afirmou o ministro.
A primeira etapa dessa parceria consistirá no desenvolvimento tecnológico de vacina para dengue com o investimento de R$ 92,5 milhões por parte da GSK, sem contar com a contrapartida do governo brasileiro.
A iniciativa fortalece o Complexo Industrial da Saúde, uma das frentes de trabalho da atual gestão do ministério voltada à auto-suficiência tecnológica no setor. As ações nessa área têm como objetivo reduzir para US$ 4,4 bilhões o déficit comercial da indústria farmacêutica e de equipamentos em saúde e desenvolver tecnologia para a produção local de 20 produtos estratégicos do Sistema Único de Saúde até o fim de 2012.
POTENCIAL NACIONAL – Nesse contexto, a indústria de vacina é um dos setores mais bem colocados. O país é o maior produtor da América Latina, com a fabricação de mais de 260 milhões de doses a cada ano. O Brasil caminha para se tornar auto-suficiente no setor, uma vez que as empresas locais respondem por 90% das doses distribuídas pelo Programa Nacional de Imunização (PNI). De um total de 26 tipos de vacinas oferecidos pelo programa, 15 são fabricadas em laboratórios brasileiros. As 11 restantes – que correspondem a 10% do total de doses distribuídas a cada ano – são importadas.
Com o desenvolvimento no setor, o Brasil será o único país da América Latina a produzir a vacina contra Influenza A (H1N1), em um contexto de pandemia e corrida mundial pelo produto. Apenas um pequeno grupo de laboratórios, concentrado nos Estados Unidos e Europa, detém tecnologia e estrutura fabril para produzir a vacina.
O Ministério da Saúde fechou a compra de 18 milhões de doses, que serão produzidas pelo Instituto Butantan, que também faz a vacina contra a gripe comum. O método de fabricação da vacina contra a nova gripe é muito parecido com o da vacina contra a gripe sazonal. O Instituto Butantan adquiriu essa tecnologia por meio de acordo com a Sanofi Pasteur, cuja transferência tecnológica termina e 2011.
INVESTIMENTO – O Ministério da Saúde investirá R$ 400 milhões por ano na compra da pneumocócica.
Outros R$ 250 milhões estão destinados para a construção da fábrica e montagem da plataforma tecnológica para produção e desenvolvimento de novas vacinas. Entre elas, a pneumocócica – do recente acordo firmado com a GSK, o aprimoramento da vacina contra febre amarela e uma vacina combinada contra leishmaniose e raiva canina.
A vacina penumocócica combinada será a quinta produzida no Brasil a partir de cooperação científica e tecnológica com outros países. O Ministério da Saúde firmou acordos com empresas estrangeiras para a produção, por exemplo, da tríplice viral – que protege contra sarampo, rubéola e cachumba, e da própria vacina contra a gripe sazonal.
No caso da nova parceria, o processo de transferência tecnológica termina em 2017, quando o Laboratório de Biomanguinhos passará a dominar todas as etapas, tornando-se auto-suficiente na produção. O acordo prevê ainda o desenvolvimento de vacinas para dengue, febre amarela e malária. O laboratório brasileiro e a GSK terão patente compartilhada nos resultados alcançados com esse trabalho.
O Laboratório de Biomanguinhos da FioCruz é um dos principais produtores de vacinas do país. Junto com o Instituto Butantan, de São Paulo, responde por 75% da produção nacional de doses. Os dois produzem 13 tipos de vacinas dos 15 fabricados no país. Os outros dois tipos são produzidos pela Fundação Ataulpho de Paiva, no Rio de Janeiro, e o Instituto de Tecnologia do Paraná (Tecpar), no Paraná. Essas instituições produzem a BCG e a anti-rábica canina, respectivamente.
Por que investir em vacinas?
O investimento em vacinas é estratégico para o país. O Brasil tem uma população de 190 milhões de pessoas e 3,2 milhões de crianças que nascem a cada ano. Por isso, demanda grandes quantidades de doses de vacinas. Seria altamente vulnerável ao sistema de saúde do país ser dependente de importação desses insumos. Isso porque o mercado internacional, muitas vezes, é afetado por situações políticas e econômicas, o que torna muito difícil a aquisição imediata de imunobiológicos, sobretudo em grandes quantidades como a que o país necessita.
Complexo Industrial da Saúde (CIS)
Esta frente tem o intuito de impulsionar a indústria farmacêutica nacional e de equipamentos de saúde para diminuir a dependência do Brasil em relação a esses produtos. Entre as suas metas está o desenvolvimento de tecnologia para a produção local de 20 produtos estratégicos do SUS até 2013.
Em 2008, o setor de saúde representou 8% do Produto Interno Bruto (PIB) e movimentou R$ 160 bilhões da economia do país. Cerca de 10% da população brasileira ativa têm vínculo empregatício com o setor.
O mercado farmacêutico nacional movimenta R$ 28 bilhões, com alta taxa de crescimento anual, colocando-se entre os 10 maiores do mundo. Mas esses números podem ser ainda mais altos futuramente, com a Política de Desenvolvimento Produtivo, conduzida pelo Ministério da Indústria e Comércio e Desenvolvimento (MDIC) e que tem como um dos braços o Complexo Industrial da Saúde.
Na década de 1990, com a abertura do mercado às empresas estrangeiras, a indústria de saúde nacional ficou enfraquecida, com isso, o déficit na balança comercial acumulado cresceu de US$ 700 milhões ao ano no final dos anos 80, para US$ 7,13 bilhões em 2008 acumulado. O Brasil tornou-se extremamente dependente de produtos com maior densidade de conhecimento e tecnologia. Por exemplo, somente em 2008, o Brasil importou US$ 1,4 bilhões em vacinas, soros e hemoderivados e exportou US$ 37 milhões em produtos de baixo valor agregado.
Mudar este cenário, no entanto, requer investimentos, melhorar qualidade dos produtos oferecidos para que possam ser mais competitivos, melhorar a estrutura das indústrias e fazer parcerias público-privadas. Em troca, serão gerados mais empregos no país.
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